Santé! A Comissão Vitivinícola Regional Alentejana, CVRA, promoveu a mostra dos Vinhos do Alentejo. Nesta edição de 2016 Alexandre Lalas, jornalista expert em vinhos portugueses, nos brindou com seu conhecimento e discorreu sobre o Alentejo com enfoque nos vinhos de talha.
Os vinhos de talha são vinhos cuja fermentação ocorre espontaneamente dentro da talha após as uvas serem desengaçadas manualmente e esmagadas. As talhas são grandes ânforas de barro utilizadas para a vinificação. É um método milenar de mais de 2 mil anos que surgiu com os romanos. Aliás, na época, as talhas eram utilizadas ainda para o armazenamento de vinhos e até azeites.
Neste processo de vinificação as películas de uvas sobem à superfície da talha formando uma capa sólida. Com a ajuda de um rodo de madeira faz-se a remontagem, e as películas mergulham e se misturam ao mosto, para transmitir ao vinho mais cor, aroma e sabor. Terminada a fermentação, que pode durar de 8 a 15 dias, essas massas se assentam no fundo. Na parede da talha, na sua base inferior, existe um orifício feito de cortiça, onde se coloca uma torneirinha. O vinho atravessa o filtro formado pelas massas de películas das uvas e sai puro e límpido para o exterior. Inegavelmente é um método natural que resulta num vinho incomparável. Confira o processo nesta animação: https://www.youtube.com/watch?v=y-1nmUvGbSE
Este tipo de vinho não deve ser confundido com vinhos de ânfora, tão em voga atualmente , uma vez que, como afirmou Lalas, os de ânfora são ali fermentados, mas amadurecem em inox ou em barricas de carvalho. Já os de talha ali permanecem até o engarrafamento, preservando a sua autenticidade histórica. À propósito desde 2012 são vinhos certificados pelo CVRA.
Intimamente ligado à história, à cultura e à vida social no Alentejo o vinho de talha faz parte da rotina da população, tanto que o dia 11 de novembro, dia de São Martinho, é o dia da "abertura das talhas", festejando o momento mais alto na relação entre o vinho e o Alentejo.
Hoje muitas casas particulares da região conservam meia dúzia de talhas, onde fazem vinhos para consumo próprio. Frequentemente, as uvas para essas produções privadas são colhidas de cachos que, depois da colheita, ficaram esquecidos nas vinhas dos maiores viticultores, na maior parte dos casos com o consentimento tácito destes. O chamado "rabisco das uvas" é uma tradição ancestral que permite aos muitos que não possuem terras e vinhas próprias, continuar a fazer e desfrutar do seu vinho.
Em Portugal, o Alentejo é o grande guardião dos vinhos de talha, que seguindo o tradicional ou adotando alguma modernização, o vinho de talha mantém-se como um produto único, sublime representante da milenar cultura do vinho no Alentejo.
Degustei o vinho de talha tradicional e outros apenas fermentados em ânforas, muito interessantes! Acompanhe minhas impressões. E até a próxima taça! momentodivino@atribuna.com.br
PROVEI E INDICO
José Maria da Fonseca - "J" de José de Sousa 2011, Évora, Alentejo, PT
Fermentado em ânforas/carvalho francês
Uva: 60% Grand Noir, 28% Touriga Francesa e 12% Touriga Nacional
Cor: rubi intenso
Nariz: cassis, amoras, pimenta, amadeirado, toques florais, complexo
Boca: seco, potente, taninoso, 14,4º GL.
R$ 343,20 Enoteca Decanter
PROVEI E INDICO
Roquevale - Tinto da Talha Grande Escolha 2009, Alentejo, PT
Fermentado em ânforas/carvalho francês e americano
Uva: Touriga Nacional e Alicante Bouschet
Cor: rubi com halo granada
Nariz: frutas maduras, especiarias e baunilha
Boca: seco, taninos macios, 14ºGL, harmônico e elegante, persistente
R$ 145,00 Marcelo Laticinios